segunda-feira, 17 de novembro de 2008

O jogador de anúncio


Andam muitos sportinguistas angustiados com o caso "Vuk". Duas notas me ficam por deixar sobre este caso. Uma é a questão do nome. O rapaz chama-se Vukčević (deve ler-se algo como Vuctchévitche) e o nome em cause é um patronímico. Ou seja, no passado houve alguém que era nome de um homem cujo nome próprio era Vuk. Chamarem Vuk ao Simon é o equivalente a dizer que um Armando Gonçalves é o "Gonçalo".

A outra nota tem a ver com a confusão que muita gente faz da profissão de futebolista. Deixem-me dizer isto com cuidadinho: não é como as outras!, ou seja, os profissionais e empregadores não são como os outros. Isto dever-se-ia compreender facilmente quando se vê que gente que passava os recreios enfiados no canto da sala com um chapéu de burro na cabeça anda a ganhar por mês aquilo que muita outra gente ganha ao fim de uns dois a 10 anos (falando dos burros que até nem ganham muito e dos espertos que até nem ganham pouco).

No futebol, quando um empregador (leia-se: clube) precisa de um novo funcionário (jogador) para uma determinada função (posição), não contacta o Expresso Emprego ou o Monster.com e deixa o seu anúncio de emprego. Vai à procura dos jogadores que precisa. Pode exigir umas coisinhas como profissionalismo, dedicação, entrega, etc, mas o que conta no fim é se o rapaz marca, passa, defende - ou seja lá o que for - bem. E é aqui que não faz sentido crucificar o Vukčević. Ele é dos poucos jogadores que não entra num campo para trabalhar (seja lá isso o que for). Ele entra para jogar. Não lhe peçam para fazer marcações, recuar no terreno, recuperar bolas ou andar a correr na pressão alta. Tretas. Entreguem-lhe antes a bola e ele tratará de, se estiver em dia bom, resolver um jogo.

Se quiserem, podem comparar isto com um trabalho criativo. Conheço gente, engenheiros de bom nome, que passam dez horas por dia em frente ao computador da empresa. Destas dez, trabalharão realmente umas três ou quatro, se estiverem em bom dia. O resto passam a brincar com uns joguitos, a ler uns e-mails, a conversar no messenger, a blogar, a ler jornais, etc. Mas, e aqui é que está a coisa, eles são a razão de uma empresa ser lucrativa. Não é com os outros marialvas que trabalham efectivamente as oito horinhas por dia, sem parar e com disciplina morfeo-liberal. É com os que não fazem um pevo em 70% do tempo.

Poderão dizer que estes criativos produziriam muito mais se trabalhassem os tais 70% do tempo mas, e aí é que está, isso seria falso. Se eles fizessem sequer um esforço para estar a trabalhar concentrados 100% do tempo, seriam iguaizinhos aos colegas do lado. Produziriam, mas o mesmo que os macacos amestrados do open-office sem ar condicionado. Trabalhando apenas uns 30% do tempo conseguem realmente ser criativos. É por isso que não são habitualmente contratados por anúncios, antes são convidados pelas empresas. É por isso que não têm os chefes a perguntar-lhes o que andam a fazer, antes são deixados em paz. Porque os chefes sabem que o que sair vai ser precioso. Precisamente como com os criativos do futebol.

Paulo Bento não entende isto. Não é culpa dele. Ele era um daqueles funcionários básicos que se encontra nos anúncios. Melhor que os outros, é certo, mas apenas um mais. No Sporting dele até poderia ter contratado metade da equipa por anúncios de jornal. Não brinco, é verdade. Bastar-lhe-ia ter dois ou três de qualidade real no resto do plantel. Vukčević é um deles. Daqueles a quem não se pode pedir que faça nada mais do que aquilo que sabe fazer: inventar coisas que mais ninguém sabe. E Paulo Bento não tem desculpa. O director desportivo Pedro Barbosa era igualzinho, se bem que sem pêlo na venta. Isto deveria ser compreendido para as bandas de Alvalade.

Infelizmente, com Paulo Bento ao leme, ainda se verá no jornal do Sporting o seguinte anúncio:

«Procura-se médio criativo. Deve ter resistência física, capacidade de choque, bom passe e ter espírito de equipa. Deve dar prioridade à correria em vez da invenção. Deve ser capaz de marcar uns golinhos de tempos a tempos. E ser bastante obediente. Responder ao número 26 deste jornal e pedir para falar com o Sr. Bento».

PS - pergunto-me o que diria esta malta. Especialmente estes dois.

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